Já ouvi muita besteira dita de
púlpito. Ouvi pastores ameaçando aqueles que não podiam dizimar (através
da culpa, da acusação ou da simples imposição do medo); ouvi pastores
dizendo que Deus só ouve orações quando duas pessoas se unem; ouvi
pastor dizendo que devemos acobertar os erros dos irmãos (por piores que
sejam); ouvi pastor garantindo que Deus ouve sempre o último desejo de
um morimbundo (esse descobriu o segredo da imortalidade ou da salvação
expressa), ouvi, enfim, barbaridades. Mas a que mais ouvi, foi a de que o
Reino de Deus está próximo, que Jesus está voltando e que você precisa
correr e se esconder sob uma denominação qualquer. E aí começa a guerra
para ver quem arrebanha mais gente. Nessa guerra vale tudo:
televangelistas mostrando falsos milagres, pastores prometendo coisas
que não estão na Bíblia, gente vendendo um pedaço do céu. São pastores
que
envergonham o reino, em causa própria. Por essa razão, resolvi
reproduzir aqui um estudo do Ministério Pequenos Grupos da Ibab, sobre o reino de Deus e religião. Através dele, vocês entenderão que o reino de Deus já
está entre nós. E que nosso ministério não precisa passar por um
púlpito. Basta que o exerçamos onde trabalhamos, com quem nos
relacionamos, em nossas atividades diárias, através do exemplo e da ação
amorosa e efetiva. Não precisamos ser adeptos de religião alguma, para
fazermos parte dele. Tampouco precisamos de ritos e doações, ou
estarmos sob os cuidados que qualquer denominação. Precisamos, isso sim,
amarmos ao nosso próximo, como a nós mesmos. Aí você terá
verdadeiramente sido alcançado pelo evangelho da graça, que visa afetar o âmago das pessoas e de seus relacionamentos.
Pra. Maria Luísa Duarte Simões Credidio
Vinho Novo, Odres Novos II- O Reino de Deus
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Ninguém põe vinho novo em vasilha de couro velha; se o
fizer, a vasilha rebentará, o vinho se derramará e a vasilha se
estragará. Ao contrário, põe-se vinho novo em vasilha de couro nova; e
ambos se conservam.
[Mateus 9.17]
O
chamado para o reino de Deus não é um apelo para uma nova religião ou
uma nova experiência religiosa, mas uma convocação para a transformação
[da vida] do mundo. A expressão "odre novo" não diz respeito a um
sistema e uma estrutura religiosa mais leve, flexível, menos dogmática,
menos hierárquica, ou menos legalista. Na verdade, por trás das palavras
de Jesus existe uma proposta de abolição de qualquer sistema ou
estrutura.
Todo e qualquer sistema ou estrutura será um odre velho:
"Certa
vez, tendo sido interrogado pelos fariseus sobre quando viria o Reino
de Deus, Jesus respondeu: "O Reino de Deus não vem de modo visível, nem
se dirá: ‘Aqui está ele’, ou ‘Lá está’; porque o Reino de Deus está
entre vocês" ou "dentro de vocês"
[Lucas 17.20,21]
O fato de que "o reino de Deus não é visível" não significa que o reino de Deus não pode ser percebido. Ele é invisível, mas não é imperceptível. É isso o que dizer que "o reino de Deus está entre [dentro] vocês".
Por esta razão, Jesus usou as metáforas do sal, da luz, do fermento e do vento para se referir à presença do reino de Deus [Mateus 5.13-16; 13.33; João 3.8].
Jesus
jamais pretendeu uma nova estrutura e um novo sistema religioso para
Israel. Ele não pretendia reformar o Judaísmo, nem tampouco propôs uma
nova experiência religiosa em termos de sistemas e estruturas. Suas
palavras sempre afetaram as pessoas em sua interioridade. O vinho novo é
o Evangelho da graça de Deus, e isso não gera uma nova religião.
Os odres novos são a nova mentalidade (graça em Jesus em detrimento da
Lei em Moisés), nova dinâmica de espiritualidade (além do
culto-clero-domingo-templo), e um novo tipo de gente (novo nascimento).
Não
se trata de deixar de freqüentar a catedral para a missa para passar a
frequentar um grupo informal de oração na casa de um cristão. A questão é
a nova mentalidade, a nova dinâmica de espiritualidade, e um novo tipo
de gente.
A
mensagem de Jesus e sua proposta de espiritualidade não estava voltada
para uma reforma da religião judaica ou do sistema religioso de sua
época. O vinho novo do evangelho da graça de Deus visava afetar o âmago
das pessoas e de seus relacionamentos.
Paulo Brabo descreve bem essa nova mentalidade, nova dinâmica de espiritualidade, e principalmente o novo tipo de gente em seu artigo Dez razões para não ser cristão (A Bacia das Almas, Editora Mundo Cristão). O título provocativo sugere que o Cristianismo se
tornou uma religião como as outras, com o risco de contrariar e
subverter o espírito de Jesus. Senão, observe exemplos da mensagem de
Jesus em contraposição ao espírito da religião e dos sistemas e
estruturas religiosas.
1- Pureza de motivos
Jesus diz que a justiça dos seus seguidores deveria exceder a justiça dos fariseus [Mateus 5.17-20],
o que significava que não bastaria a prática do bem, mas exigia um
coração bondoso: a questão não é o que você faz ou deixa de fazer, mas a
qualidade de suas intenções e motivações, e na verdade, a natureza de
seu caráter. Foi por isso que Jesus repreendeu os fariseus dizendo:
"Ai
de vocês, mestres da lei e fariseus, hipócritas! Vocês limpam o
exterior do copo e do prato, mas por dentro eles estão cheios de
ganância e cobiça. Fariseu cego! Limpe primeiro o interior do copo e do
prato, para que o exterior também fique limpo".
[Mateus 13.25,26]
Jesus
condena o espírito legalista das religiões: o mero cumprimento das
regras religiosas não quer dizer muita coisa aos olhos de Deus, que vê e
julga os corações [1Crônicas 28.9].
2- Desapego a coisas materiais
Jesus ensinou que "não podemos servir a dois senhores",
indicando que Deus exige lealdade exclusiva. Entre os ídolos que
competem pelo nosso coração, o dinheiro é um dos mais poderosos [Mateus 6.19-34].
Diferentemente de muitos tele-evangelistas, Jesus, portanto, condena a
ganância e o anseio de prosperidade financeira como fonte de motivação
para a caminhada do discipulado e a busca de Deus.
3- Renúncia ao poder
Jesus
ensina que a posição de autoridade deve ser exercida para o bem comum. A
autoridade existe para o bem de todos, e não pode usar sua posição em
benefício próprio. O modelo de liderança de Jesus é a liderança
servidora:
"Vocês
sabem que aqueles que são considerados governantes das nações as
dominam, e as pessoas importantes exercem poder sobre elas. Não será
assim entre vocês. Ao contrário, quem quiser tornar-se importante entre
vocês deverá ser servo; e quem quiser ser o primeiro deverá ser escravo
de todos. Pois nem mesmo o Filho do homem veio para ser servido, mas
para servir e dar a sua vida em resgate por muitos".
[Marcos 10.42-45]
A tendência hierarquizante e de abuso de poder das estruturas religiosas fere o espírito do evangelho de Jesus.
4- Amor aos inimigos
Jesus ensinou que deveríamos ser perfeitos como é perfeito seu Pai [Mateus 5.48]. A perfeição a que Jesus se refere é a do amor, que anula qualquer expectativa de vingança [Mateus 5.38-42] e se estende não apenas aos amigos, como também e principalmente aos inimigos [Mateus
5.43-47].
A
tendência sectária ("nós somos especiais aos olhos de Deus") e
maniqueísta ("nós justos contra eles pagãos e infiéis"), característica
dos ambientes religiosos mais conservadores e fundamentalistas, é
contrária ao evangelho de Jesus.
5- Ciclo virtuoso do perdão
Jesus
ensina que devemos perdoar aos nossos devedores assim como nosso Pai
celestial nos perdoa, e inclusive condiciona a experiência do perdão de
Deus à disposição em perdoar os que nos ofenderam [Mateus 6.14,15].
A
experiência religiosa individualista e intimista, na qual o que importa
é "estar bem com Deus" independentemente da qualidade dos
relacionamentos interpessoais contraria a proposta e ordenamento de
Jesus em seu evangelho.
6- Pecado interior
Jesus
ensina que o pecado não é apenas aquilo que fazemos ou deixamos de
fazer, mas também e principalmente aquilo que abrigamos em nosso ser
interior e determina nossa consciência e caráter. Não basta não matar, é
preciso estar livre do ódio, da mágoa e do ressentimento Não matarás [Mateus 5.21-26]. Não basta não fazer sexo ilícito, é preciso estar livre da cobiça e da lascívia [Mateus 5.27-32].
A
experiência religiosa que zela apenas pelo controle do comportamento
moral está longe da proposta de espiritualidade de Jesus, que se baseia
na liberdade do Espírito e na obediência em amor:
"Foi
para a liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permaneçam firmes e
não se deixem submeter novamente a um jugo de escravidão. Ouçam bem o
que eu, Paulo, lhes digo: Caso se deixem circuncidar, Cristo de nada
lhes servirá. De novo declaro a todo homem que se deixa circuncidar, que
está obrigado a cumprir toda a Lei. Vocês, que procuram ser
justificados pela Lei, separaram-se de Cristo; caíram da graça. Pois é
mediante o Espírito que nós aguardamos pela fé a justiça, que é a nossa
esperança. Porque em Cristo Jesus nem circuncisão nem incircuncisão têm
efeito algum, mas sim a fé que atua pelo amor".
[Gálatas 5.1-6]
7- Prática da generosidade
Jesus
ensina a generosidade, o oposto da chamada Lei de Gérson: "levar
vantagem em tudo". O evangelho de Jesus propõe o serviço abnegado,
solidário e compassivo em benefício de todo aquele que sofre,
indepentemente do merecimento do sofredor. A parábola do Bom samaritano [Lucas 10.25-37] coloca
a compaixão e amor ao próximo acima das leis cerimoniais religiosas. O
bem do homem está acima da pureza cerimonial, pois "o sábado foi feito por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" [Mateus 12.27].
8- Restauração da dignidade humana (cada pessoa)
Jesus deu aos seus discípulos um novo mandamento:
Um
novo mandamento lhes dou: Amem-se uns aos outros. Como eu os amei,
vocês devem amar-se uns aos outros. Com isso todos saberão que vocês são
meus discípulos, se vocês se amarem uns aos outros".
[João 13.34,35]
O mandamento de Jesus é novo em relação à Lei de Moisés, que mandava "amar ao próximo como a si mesmo". No evangelho, a medida do amor ao próximo não é o amor próprio, mas o amor de Cristo.
O
amor é o argumento que condena qualquer prática de abuso social,
físico, psíquico, moral e, principalmente, espiritual. A religião como
fator de opressão e controle do ser humano e da consciência humana é
absolutamente condenada pelo evangelho de Jesus.
9- Rendição à graça de Deus
Jesus
ensina que o favor de Deus é fruto de seu amor, e não do mérito humano.
A mesma qualidade de relação devemos desenvolver com as pessoas. A palavra chave do evangelho é graça, e não Lei. Por essa razão, Jesus adverte: "Digo-lhes a verdade: Os publicanos e as prostitutas estão entrando antes de vocês no Reino de Deus" [Mateus 21.31].
Somente no evangelho da graça de Deus os desprezados socialmente têm primazia em relação aos virtuosos religiosos.
10- Dedicação da vida inteira
Jesus ensina que aquele que quiser ser seu seguidor deve abrir mão de viver para si mesmo.
"Se
alguém quiser acompanhar-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e
siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida a perderá, mas quem perder a
sua vida por minha causa, a encontrará."
[Mateus 16.23,24]
"Pois
o amor de Cristo nos constrange, porque estamos convencidos de que um
morreu por todos; logo, todos morreram. E ele morreu por todos para que
aqueles que vivem já não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que
por eles morreu e ressuscitou."
[2Coríntios 5.14,15]
Este
imperativo de Jesus e seu evangelho implica a dedicação da vida inteira
a Deus e a condenação de qualquer experiência religiosa egocêntrica. A
experiência de Deus não é mais um gomo na laranja das nossas vidas, mas
algo que afeta a laranja inteira. Não se trata de incluir a vida
religiosa ao lado da vida familiar, profissional ou cidadã. Trata-se de
viver todas as dimensões da existência sob a influência e a autoridade de Deus.
Além
disso, a experiência religiosa que faz de Deus um meio para atingir um
determinado fim (conseguir um milagre, prosperar financeiramente, parar
de sofrer) transforma Deus em ídolo. Deus é um fim em si mesmo: buscamos a Deus por Deus. Quem busca a Deus por causa de seus próprios interesses comete o pecado da idolatria.
Considerações finais
Está claro, portanto, que o
chamado para o reino de Deus não é um apelo para uma nova religião ou
uma nova experiência religiosa, mas uma convocação para a transformação
[da vida] do mundo.
Toda a mensagem de Jesus está voltada para a transformação das pessoas e
seus relacionamentos, quer seja com Deus ou mesmo entre si. Jesus não
pretendia reformar ou fundar uma religião. Não estava interessado em
sistemas e estruturas religiosas. Sua proposta implicava a possibilidade
de uma completa transformação na mente e coração das pessoas, a
instauração de uma nova dinâmica de espiritualidade e a existência de um
outro tipo de gente, capaz de viver em qualquer sistema ou estrutura
religiosa, ou mesmo sem qualquer
sistema ou estrutura.
OBS:Qualquer
pregação ou posição que fuja disso, deturpe isso, ou se apegue apenas a
partes desse todo, é falsa e visa iludir aos irmãos. Portanto, devemos
vigiar sempre e nos informarmos a respeito dos grupos e igrejas que
pretendemos frequentar.
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