Observação
         Hoje tirei a ministração semanal de um dos meus livros prediletos:Uma outra espiritualidade, fé graça e resistência", publicado pela Editora Mundo Cristão em 2006. Aprecio tanto esse livro quanto O Evangelho maltrapilho, também da Editora Mundo Cristão, 2005. Que vocês façam bom proveito dela e sejam edificados, da forma que eu fui. E, se encontrarem algum pastor com as qualidades negativas descritas aqui abaixo, FUJA! Cobertura espiritual podre não faz bem à vida de ninguém. Muito menos à daqueles que estão enfrentando desertos e lutas.

Pra. Maria Luísa Duarte Simões Credidio 



PASTORES  e pastores




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     A recomendação de Jesus "Não julgar para não ser julgado" tem sido mal interpretada. A maioria usa para não emitir opiniões a respeito de outras pessoas. Mas não é isso que Jesus pretende. Ele recomenda que se tenha opinião a respeito dos outros e até mesmo insiste na necessidade de observar e chegar a conclusões a respeito dos outros. E no mesmo texto recomenda o não- julgamento. Adverte que devemos tomar cuidado com falsos profetas, que se aproximam disfarçados de ovelhas, mas que, na verdade, são lobos selvagens. Para se discernir um lobo vestido de ovelha é necessária muita observação. Só quem presta atenção no outro consegue ver que ele é algo diferente do que pretende fazer parecer. Desmascarar é diferente de julgar. Desmascarar é necessário à sobrevivência espiritual. Seguir um lobo é perigoso. Cair na conversa de um lobo é fatal. Lobos são letais. Julgar é estabelecer veredictos, determinar sentenças, prescrever penalidades. Julgar é prerrogativa divina. Observar para discernir e desmascarar é responsabilidade humana, geralmente atribuída, antes de mais nada, à liderança da igreja.
     Tenho observado bastante, ao longo dos últimos anos. Minha base de informação consiste de horas de paciente escuta à frente da televisão, centenas de artigos colecionados a respeito da configuração evangélica, dezenas de livros, dissertações de mestrado e doutorado a respeito do fenômeno evangélico, além de muita conversa, tudo isso regado com muita oração e reflexão angustiada. Cheguei à conclusão que existem, pelo menos, quatro tipos de pastores no movimento evangélico brasileiro.
     O primeiro tipo chamo de pastores-lobos. Pastores corrompidos. Alguns conscientemente, outros sinceramente enganados. Mas corrompidos na alma, na mente, no coração. Corrompidos no entendimento da verdade, na relação com o sagrado e o divino. Pastores de si mesmo. Homens que se utilizam da fé e do desespero alheios para alcançar seus próprios objetivos, servir a seus próprios interesses, implementar sua visão particular, desenvolver seu projeto pessoal de poder, dinheiro e imoralidade de toda sorte (ou azar). Homens que atuam no ramo da religião, no segmento evangélico, mas estão absolutamente distantes do Evangelho de Jesus Cristo, distantes de sua mensagem, seu espírito, seu caráter, seus propósitos, seus valores, seus conteúdos mais profundos. Oportunistas ou iludidos.Corrompidos do mesmo jeito.
     O segundo tipo é chamado de pastores-ovelhas. Aqueles são lobos vestidos de pastores. Esses são ovelhas vestidas de pastores. Cristãos sinceros e dedicados que jamais deveriam ter sido investidos da autoridade que acompanha a função pastoral. Ou deveriam ter recusado os insistentes apelos das outras ovelhas. Homens que pretendem servir a Deus, e o fazem com integridade e sinceridade ao longo dos anos, mas que nunca foram separados pelo Espírito Santo, isto é, homens aos quais o Espírito não constituiu bispos.
     São dotados de boa vontade e capacidades.Experimentam até certo sucesso profissional, sempre foram bons contribuintes financeiros nas comunidades e até mesmo as dirigiram muito bem na ausência dos pastores (e até melhor, em alguns casos), mas sua contribuição era circunstancial, emergencial, e não vocação perene. Falta-lhes carisma.Falta-lhes autoridade divina. Faltam-lhes o coração e a alma de pastor. Falta-lhes a paixão. Faltam-lhes vísceras pastorais. Receberam o cetro. Receberam o título. No entanto, não receberam a unção. Aquilo vem de baixo. Esta, a unção, vem do alto. Não pode ser forjada, manipulada, tomada de assalto. Como se diz entre as ovelhas, estes são os que seriam bons crentes, mas preferem ser péssimos pastores.
     O terceiro tipo chamo de  apenas pastores. Foram chamados pelo Espírito Santo- vocacionados. Ouviram a voz. Foram seduzidos e seduzidos ficaram. O senhor que chamou foi mais forte do que eles e prevaleceu. Carregam o estigma de Cristo e sofrem dores de parto por seus rebanhos, cumprem em sua própria carne o que resta dos sofrimentos de Cristo, em favor da Igreja. Pesa sobre eles a preocupação por todas as igrejas, e quando alguém se enfraquece, eles se enfraquecem também. Quando alguém cai em pecado, ficam muito aflitos. Estes são os que servem a Deus com todas as forças da alma. Jamais seriam realizados e felizes fazendo qualquer outra coisa.
     No entanto, na mesma intensidade com que se dedicam a Deus, são assolados pelas sombras de seu mundo interior ainda não resolvido, não suficientemente redimido, não completamente curado e parcialmente subjugado em obediência à autoridade de Cristo Jesus. São homens de lutas e dores. Experimentam a contradição dos anseios profundos de santidade, doação, autodoação, que convivem com o egoísmo arraigado, o pendor para o mal e para o pecado, que os obriga a gritar: "Miseráveis somos, quem nos livrará deste corpo mortal?" Como bem disse um meu amigo, pastor e pastor de pastores, são homens que algumas vezes Deus os tem e, algumas outras, eles têm a Deus nos próprios termos e conveniências.
      Apesar das contradições e angustias na alma, Deus sabe que eles o amam e conscientemente repetiriam com Dostoievski: "Vai-te verdade, pois tudo o que quero é Cristo". Deus os compreende mais a do que eles mesmos. Deus os ama de um jeito diferente e os usa, apesar do que são, em detrimento do que tentam ser.
     Finalmente há os pastores que nem sei como classificar. Talvez pudesse usar a palavra "iluminados", mas ainda não sei se é a melhor maneira de descrever essa gente. São homens que romperam a linha que os nivela aos mortais. Pessoas equacionadas na alma, resolvidas, que vivem no patamar que a Bíblia chama de "Plenitude do Espírito", sendo esta plenitude não uma experiência eventual, mas um status perene, uma qualidade de ser que se consolidou. A diferença entre os "iluminados" e os pastores é que estes têm um ministério , e aqueles são o ministério.
     Comigo acontece de receber elogios ao que faço: um sermão inspirado, um artigo lúcido, um aconselhamento sábio. As pessoas geralmente agradecem o fruto do meu trabalho. Fico satisfeito, honrado e agradeço e Deus a oportunidade de ser útil. Quando o feedback do meu trabalho não vem ou demora, pergunto o que acharam e como avaliam meu desempenho. Preciso de reforço externo para a sustentação de minha auto-imagem e a consolidação de minha identidade. Os "Iluminados" são diferentes. Eles já sabem o que são. E não estão mais ocupados ou preocupados em saber o que pensam do que fazem. Influenciam pela vida, e não pela obra- ou se você preferir, sua vida é a sua obra, e o conjunto da obra é maior do que qualquer obra em particular.
     Homens assim nos conduzem ao mistério do silêncio.Diante deles, percebemos a tolice do elogio, cuidamos das palavras e experimentamos um certo constrangimento, como se eles soubessem o que se passa dentro de nós e das coisas erradas que fazemos escondidas. A sensação é a de que Deus conta tudo para eles, que olham para nós com aquela cara de misericórdia, acreditando que ainda chegaremos lá. São poucos. Mas estão espalhados por aí. Bem-aventurados os que tropeçam neles. Até porque eles jamais se interpõem em nosso caminho. Não se julgam dignos.
Ed René Kivitz

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